Eu sinto vergonha de escrever sobre nós, porque finalmente é real. Fico com medo das palavras expressarem a concretude que tanto almejo e temo ao mesmo tempo. Tímida em frente à folha ou ao teclado, penso em cenas reais e não mais fantasias, porque, no fim, as fantasias não chegam aos pés do que estou vivendo. Não poderiam chegar.
O que vivemos a sós mora onde não há palavras. Eu tento criar sentenças, mas me vejo sentenciada a sentir sem entender direito. Me vejo convidada a renunciar ao entendimento, a silenciar a racionalidade e deixar os impulsos darem forma aos movimentos, às palavras. Toque. Respiração. Urgência. Desejo.
Eu queimo. Você me acende; eu te acendo. Nós não paramos de queimar. O fogo ora sobe, ora vira brasa, mas não apaga. Ele me consome por dentro, me enlouquece de sede e me joga às tuas águas — tão profundas e enigmáticas. Me sinto dentro da sua casa, mas não falo de paredes e teto, e sim de onde você existe verdadeiramente: no fundo. Nas emoções não verbalizadas. Na atenção apurada, na intensidade. Nas águas.
E eu não tenho tanto fôlego, mas você sabe… Eu também gosto de perder o ar.
Eu também gosto de perder a hora, e é tão fácil com você. Do portão pra dentro, não quero saber de ponteiros; pra fora, só de pontas. E elas queimam como nós, só que apagam no fim.
Acostumada a quem se perde em labirinto, sem perceber baixei a guarda e te deixei atravessar os muros de grama. Eu não sei não ceder quando você me conduz. Me sinto em hipnose. Você já sabe me tirar do eixo e me fazer agonizar com o simples toque. Sabe me ler tão bem que escreve as coisas certas no meu corpo. Me faz implorar pra que não acabe, porque isso sim acabaria comigo.
Me encontro, aqui, viciada em sensações que revivo por lembranças, e sinto muito mais do que posso explicar. Caso não saiba ver, eu sinto muito. Meu corpo grita seu nome, e a nossa língua não traduz tão bem quanto o francês: petit mort. Pequena morte. Eu tenho mil orgasmos sem gozar. Eu morro várias vezes. E você sempre me ressuscita.
set/2023